Sábado preciso ir até o centro
da cidade onde moro para resolver algumas coisas. Entro no ônibus, ele está
cheio, escolho um lugar pra ficar, e espero sem a menor paciência ele seguir viagem,
detalhe: o trânsito, ás dez da manhã já está absurdo. Em pé, e com pressa, penso que
é inútil me estressar. Não há o que fazer a não ser esperar.
Sem a menor intenção, meu ouvido gruda na
conversa alheia (isso foi totalmente involuntário).
— Então, eu tive que me afastar...
Lastimável, pois faltavam apenas dois anos para me aposentar.
—Com a saúde não se brinca, é
realmente uma pena...
Uma ambulância passa
rapidamente tirando minha concentração da conversa. Pelo pouco que ouvir do
papo, deu para sacar que os dois eram professores do ensino médio: ela
professora de matemática, e ele, até então, eu não sabia.
—Bom, desço no próximo ponto.
Boa sorte, ela disse se despedindo.
Eu me sento em seu lugar,
quieta e ainda sonolenta esperando o trânsito desafogar, uma vez que
estou sentada, isso se torna menos maçante.
—Tudo parado né? O professor
puxa assunto.
—Pois é...
—Deve ter acontecido algum
acidente, viu aquela ambulância?
—Vi sim. Deve mesmo... O pior
que essa é avenida principal, não temos outra alternativa. Digo olhando para a
fila de carros á nossa frente.
—Lá atrás, acho que você não
deva se lembrar, pela idade. O prefeito da cidade cogitou fazer duas avenidas,
mas como o governo só pensar em ganhar dinheiro e não está nem pouco preocupado
com a sociedade, a ideia só passou de ideia. Ele sorriu com simpatia.
—É mesmo? Seria ótimo se fosse
concretizado.
—Com certeza...
O professor aparentava ter seus
cinquentas anos, dissertou muito bem como era a política naquela época (nada muito
diferente do que agora), o que agregou muito ao meu conhecimento.
Entramos em outro tema, também
ligado ao governo: educação.
—Não sei, se você reparou, mas
eu e minha amiga, aquela que desceu?
—Sei... Balanço a cabeça.
—Somos professores do ensino
médio. Ela está afastada...
—É mesmo? Faço desentendida.
—Não porque não quer trabalhar,
e sim, por conta do estresse. Para seu bem, ela se afastou.
—Entendo.
—E, o senhor é professor do quê?
—Matemática, ciência, biologia,
geografia e história. Ele disse como se fosse à coisa mais natural do mundo.
Uau! Penso.
—Trabalhei muito tempo como
bancário, porém meu coração gritava por essa profissão, naquele tempo era
bom... Ele disse sorriu com a lembrança. — Eu tinha prazer em dar aula,
acrescentou.
—As coisas mudaram muito hoje
em dia.
O ensino, os professores e principalmente
os alunos mudaram, eu faço uma nota mental.
—E como! Eu chego para fazer o
que faço de melhor na vida, e fico com coração entristecido quando entro na
sala de aula. É cadeira voando pelos ares, folhas de papel amassadas pelo chão,
celular no volume alto tocando funk, e as meninas? Dançando até o chão.
—Meu Deus! Não imaginava que
tinha chegado a esse ponto.
—Eu já fui agredido...
—Você está brincando?
—Fui. O garoto ficou bravo
porque comecei a escrever na lousa a matéria. Ele me deu dois socos na barriga.
Na hora não sentir meu corpo, fiquei parado sem reação. O professor de Física
percebeu a movimentação e foi até a minha sala e segurou o garoto.
Coloco a mão na boca assustada
—O negócio ficou complicado
para nós, ele rir da minha cara de assustada.
—O senhor lecionar em quantas
escolas?
—Duas. Uma pública e a outra
particular.
—Na particular, as coisas são
diferentes, não são?
—Com certeza! Ganho o dia
quando tenho que ir pra lá. Olha, eu ainda não perdi o controle porque penso
que falta pouco para me aposentar. Perder a cabeça agora é um risco bem alto.
Então, todas às vezes, que entro na sala e vejo as cenas que lhe falei, penso
comigo mesmo: o problema não sou eu! Eles não querem aprender!
—Tem que pensar assim mesmo,
estimulei.
—Você acredita que eles me
pedem para não dar aula?
—Não duvido demais nada, depois
disso...
— É por isso que ninguém quer
ser professor no Brasil.
Uma dura realidade, reflito.
—Sabe o que eu fico pensando? Que
mundo meus filhos vão encontrar pela frente?
—Isso é algo para se preocupar
mesmo, do jeito que anda as coisas... Ele sorri.
Finalmente o trânsito desafoga
e os carros começar andar.
—Parece que está andando agora.
—Ainda bem! Digo contente.
—Bom, foi um prazer conhecê-la.
Meu nome é José. Professor José.
—O meu é Érica, boa sorte!
Desejo me despedindo.
O prazer na verdade foi meu, gosto
de conversar com pessoas inteligentes. Elas na maioria das vezes me inspiram.
Eu fico pensando o quanto esses
professores sofrem, o ensino está como está – por causa do governo. E a culpa
cai sobre o profissional docente. De modo que, os professores se veem no fogo
cruzado: de um lado, os alunos que não querem aprender e do outro, o governo
que disse que o baixo índice das notas é devido ao mau ensino.
O sistema educacional cobra dos
professores cada vez mais trabalho, como se a educação por si só, fosse
resolver todos os problemas sociais. Os professores não podem ser taxados de
vilões nesse cenário, onde todos têm culpa.
O grande fato é: não é só
sistema educacional que está diferente. O mundo e suas crenças estão de cabeça
pra baixo. O que não preocupa só a mim, como á todos nós.
Tudo isso é muito assustador,
não sou perita no assunto e chego muito longe de ser. Apenas fiquei [e estou]
indignada de qual futuro meus filhos, irão encontrar.
Eu seria muito otimista em
dizer que isso pode mudar? Uma vez perguntei a uma garota de dezessete anos:
— Qual seu livro favorito?
—Livro? E ela se rachou de rir
—O que foi?
—Eu odeio ler, não tenho a
menor paciência!
É esse o país em que vivemos – se
vai melhorar, eu não sei. Mas, como boa Brasileira tenho esperança.
2 comentários:
Muito triste não é Erica!!!
:(
Sei nem o que dizer...
Adorei seu post, dura realidade..
beijos
http://dailyofbooks.blogspot.com.br/
Boa note Érica,
Esse tema é importante e merece ser sempre discutido é triste mas é pura realidade...parabéns pelo post...abçs.
http://devoradordeletras.blogspot.com.br/
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